Apesar de a inflação, a economia internacional e as contas externas seguirem por trajetórias benignas, a retomada do crescimento não deslancha e continua empacada. Os dois principais fatores que confessadamente inibem uma retomada cíclica mais vigorosa é o problema fiscal e o caos político. A situação crítica das contas públicas não será resolvida com políticas de ajuste de curto prazo nem com a impopularidade do governo Michel Temer. As incertezas no âmbito político reduzem a confiança dos agentes econômicos que adiam seus planos de consumo e investimento, com impactos negativos e perversos sobre a retomada da economia. Como é comum ocorrer em períodos de retomadas cíclicas, esperava-se que os investimentos fossem um dos principais drivers para o crescimento da demanda. Porém, esse componente do PIB é muito sensível ao nível de confiança sobre o desempenho futuro da economia. Com um governo central cada vez mais anêmico, a crise política dificulta uma reação à deterioração fiscal. A reforma da Previdência, principal medida para desacelerar o aumento do gasto público e permitir uma estabilização, ainda que lenta e gradual, ficou mais difícil de passar pelo Congresso. A própria luta política pela sobrevivência reduz os graus de liberdade do governo para conter o gasto no dia a dia e complica a gestão das contas públicas, a começar pela capacidade do governo de atingir a meta de déficit primário para 2017.
Crise política
Apesar de sabido que Michel Temer nunca foi um presidente popular, após a notícia da delação da JBS ter vindo a público sua popularidade caiu ao nível mais baixo para um presidente da República, desde o fim da ditadura.
Nível de Confiança
Como não poderia deixar de ser, a crise política pós 17 de maio afetou os indicadores de confiança de empresas e consumidores e interrompeu a tendência ascendente que vinha desde o início do ano. As pesquisas de confiança revelam a mudança de humor de empresas e consumidores por conta da crise política. No gráfico abaixo, o Índice de Confiança do Empresário Industrial (ICEI) da CNI de julho caiu para 50,6 pontos, o que representa recuo de 1,3 ponto na comparação com junho, mês em que o índice já havia registrado queda. Como situa-se praticamente sobre a linha divisória de 50 pontos – que separa a confiança da falta de confiança –, o ICEI de julho não afirma que os empresários estão confiantes, tampouco sem confiança. Desde março último, quando atingiu 54,0 pontos, o índice já caiu 3,6 pontos. Frente a julho de 2016, o ICEI mostra crescimento de 3,3 pontos. Todavia, ainda segue abaixo de sua média histórica de 54 pontos. A menor confiança é um entrave adicional à reativação dos investimentos no setor industrial.
Contas Públicas
Nos 12 meses encerrados em maio, o setor público consolidado apresentou déficit primário de 2,5% do PIB, basicamente inalterado em relação ao acumulado em 2016. No interim dos últimos 12 meses, a dívida bruta do governo geral subiu de 67,7% para 72,5% do PIB, não havendo sinais de que vá dar trégua na sua escalada. Segundo cálculos da REAG, a dívida deve ultrapassar a marca de 80% do PIB em meados de 2019.
Atividade Econômica
O desempenho razoavelmente positivo revelado pelos recentes dados de atividade econômica diz respeito ao caráter disseminado da expansão, mas nossa expectativa é de que nos próximos meses teremos estabilidade do nível de produção industrial. Assim, o cenário de recuperação lenta e gradual da economia se mantém firma em nossos cenários macroeconômicos. Na segunda metade deste ano a atividade econômica já deverá caminhar para o terreno positivo na comparação das taxas interanuais. Nossa projeção de crescimento do PIB para 2017 se mantém em 0,3%, assim como para 2018 ainda está em 2%.
Mercado de Trabalho
O mercado de trabalho apresentou tímida recuperação no segundo trimestre. O emprego formal medido pelo CAGED apresentou geração líquida de quase 10 mil vagas em junho, a terceira alta consecutiva de criação de empregos no ano. A taxa de desemprego medida pela PNAD Contínua alcançou em maio o patamar de 13,3%, com melhora considerável em relação aos 13,6% registrados em abril. Apesar dos números menos desanimadores, ainda é cedo para garantir que o mercado de trabalho iniciou uma trilha de recuperação, uma vez que as previsões para os indicadores de emprego têm sido perturbadas por mudanças estruturais que vêm ocorrendo no mercado de trabalho brasileiro desde o início da atual crise econômica.
Inflação
A queda do IPCA de junho (-0,23%) representou a menor taxa de variação para o mês desde a implantação do Plano Real. Foi também a menor taxa de variação mensal do indicador desde agosto de 1998, quando esse caiu 0,51%. Explica-se esse resultado especialmente favorável por quedas amplas e simultâneas de preços de alimentos, energia elétrica e gasolina. Apesar de possíveis altas sazonais de preço no segundo semestre deste ano, a inflação dos alimentos deve continuar ajudando a puxar o IPCA geral para baixo até o final deste ano, que deve ficar em 3,8%. Para o ano que vem, porém, sem os reflexos da supersafra, expectativa é que fique entre 3% e 4%.
Política Monetária
Fazendo uma retrospectiva da atuação do Copom, observa-se que a adoção da política de afrouxamento político foi adotada cautelosamente e assertivamente, geralmente em ritmo inferior ao esperado por grande parte do mercado. Observa-se também que os dois anos de recessão não se haviam mostrado suficientes para trazer a inflação para baixo. Em outras palavras, a recessão por si só não foi capaz de derrubar a inflação. Além do ciclo de cortes na Selic, o processo de queda da inflação contou também com a aprovação da emenda constitucional do teto dos gastos, medida historicamente sem paralelo para conter o gasto público, que contribuiu para a ancoragem das expectativas de inflação. Além disso, tivemos também os choques do câmbio e dos alimentos. Essa combinação de fatores mudou expressivamente a dinâmica da inflação, de forma até certo ponto pouco previsível. Com a decisão de reduzir a meta de inflação para 2019 e 2020, as expectativas de inflação cederam ainda mais, o que permite ao Copom puxar a Selic para baixo dos 8% a.a. sem pestanear.
Mercado Financeiro
Parece que o mercado financeiro criou anticorpos a todo o caos político. Nada do que tem acontecido em Brasília e na Lava-Jato parece estar mais incomodando o risco país, o dólar, os títulos públicos e a bolsa. Aparentemente essa imunidade veio após o choque sofrido em 17 de maio passado, com a divulgação do áudio entre Temer e o dono da JBS. A aparente calmaria do mercado financeira surpreende diante do tamanho do problema crônico fiscal e da crise política, mas é compreendida por conta alguns fatores: (i) a boa situação das contas externas e o espaço para o Banco Central atuar vendendo dólares no mercado futuro; (ii) a ampla liquidez internacional, casada com sinais de aquecimento no crescimento global; (iii) o fato de a crise não envolver a equipe ou a política econômica, como em outros episódios do passado; (iv) o amplo espaço para o Banco Central continuar reduzindo a Selic, em função do comportamento favorável da inflação; (v) vitória do governo na votação da reforma trabalhista no Senado e na votação do arquivamento do processo contra Temer, reforçando a “falsa” visão de que o governo tem apoio no Congresso. Apesar de enumerados os vetores que sustentam esse cenário de estabilidade, sua solidez é frágil frente ao tsunami que a voraz política fiscal pode gerar a qualquer momento. A questão fiscal, apesar da responsabilidade que tem sobre a crise, não é, obviamente, o único risco. A inflação, no acumulado de 12 meses, tende a subir a partir de setembro. Já é factível que no primeiro semestre de 2018, a discussão acerca da taxa básica de juros mude de “até onde a Selic vai cair”, para “quando ela começará a subir”. O cenário externo também pode ser fonte de turbulência, a partir do momento em que o FED e outros bancos centrais iniciarem o processo de normalização das suas políticas monetárias. Por fim, não se pode descartar o surgimento de fatos novos que levem a recrudescimento da crise política. Em outras palavras, engana-se quem acha que houve um efetivo divórcio entre as crises política e econômica. O mercado está simplesmente nauseado temporariamente das notícias de corrupção.
Setor Externo
O destaque continua a ser o desempenho da balança comercial, cujo superávit em junho levou o saldo comercial do primeiro semestre a atingir US$ 36 bilhões. As exportações, que estavam desacelerando em valor desde março, voltaram a crescer. Já quanto às importações, registrou-se a primeira queda na comparação mensal 2016/17 desde o início do ano. A melhora das exportações foi liderada pelo volume. Já para o recuo das importações, preços e volume tiveram igual contribuição. Neste último caso, ainda é preocupante o recuo no volume, indicando o quão distante ainda estamos de uma recuperação sustentada da economia.
Economia Internacional
Com a desinflação na economia americana, a economia internacional continua muito benigna para o Brasil.