Hoje, o IBGE anunciou que a atividade econômica voltou a crescer após dois anos consecutivos de retração, com o PIB expandindo-se 1% entre janeiro e março comparativamente ao trimestre imediatamente anterior (com ajuste sazonal). Foi a primeira alta do PIB por essa leitura, após oito trimestres consecutivos de queda. O presidente Michel Temer, atolado no lamaçal de uma grave crise política que pode lhe custar o mandato, correu rapidamente para anunciar o fim da recessão. Na verdade, os números não mentem, mas as pessoas podem fazer interpretações viesadas. Focando apenas no crescimento baseado na análise comparativa com o último trimestre do ano passado, a expansão anunciada corresponderia a enxergar a economia como um copo meio cheio. Mas se fizermos uma leitura mais atenta dos demais números e bases comparativas do levantamento do IBGE, com vistas a ter uma visão mais ampla do nosso cenário macro, enxergaríamos que o copo da economia ainda está meio vazio e a atividade continua acuada, com possibilidade nada remotas de voltar a registrar perdas neste ano. Na comparação com igual período de 2016, o PIB recuou 0,4%, o 12º resultado negativo consecutivo nesta base de comparação. Também no acumulado dos quatro trimestres terminados no primeiro trimestre de 2017, o PIB amargou perda de 2,3%.
O resultado positivo do PIB no primeiro trimestre é basicamente um reflexo da maior expansão da agricultura em 21 anos. Impulsionada pelas safras espetaculares de soja, milho, arroz e fumo, a atividade no campo teve alta de 13,4% no primeiro trimestre contra o trimestre anterior, o que foi o suficiente para que um setor que responde por cerca de 5,5% do PIB carregue a economia. Além disso, com a superssafra, o câmbio mais favorável e o aumento do preço das commodities, as exportações de grãos e também de petróleo, gás, minério e automóveis responderam bem, com alta de 4,8% no primeiro trimestre. Está aqui o motivo (restrito a alguns setores) de a indústria ter crescido no período.
Os dois principais motores da retomada mais robusta e sustentada da economia, porém, continuaram no campo negativo, e é isso que ainda nos faz entender que não é momento para sair comemorando. Os investimentos retrocederam pela 12ª vez consecutiva. O consumo das famílias, que responde por cerca de 60% do PIB, registrou perdas 3,3% em 12 meses. Os números do IBGE mostram que estamos cronologicamente em 2017, apesar de nossa economia ter recuado para patamares de 2010, exatamente no mesmo lugar que estava ao final de 2016.
Diante dos números do PIB anunciados hoje, enxergamos uma menor pressão da recessão sobre a economia, mas ainda estamos em terreno negativo e inseguro. Principalmente quando ampliamos o campo de visão para o mercado de trabalho e o ambiente político. Contabilizamos em abril mais de 14 milhões de desempregados e temos que digerir uma crise política que vem corroendo as melhores intenções e confiança de consumidores e investidores. Nesse cenário mais nebuloso e conturbando, fica difícil afirmar com todas as propriedades que haverá uma recuperação sólida da economia nos nove meses seguintes. Principalmente porque não é esperado nova contribuição espetacular da agricultura como a que tivemos neste início do ano. Ou seja, nós enxergamos que o copo da economia permanece meio vazio. Diante das considerações acima, mantemos nossa projeção de que o PIB encerrará este ano com discreto crescimento de 0,3%.