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Cenário Macroeconômico fevereiro/ março 2018: boas novas no front doméstico e atenção para os mercados financeiros globais

O mês de fevereiro foi marcado por surpresas positivas para a economia doméstica, mas também por turbulências nos mercados financeiros globais, as quais interpretamos como sinais de acomodação nas condições macroeconômicas externas. O quadro geral continua favorável a um bom desempenho da economia brasileira em 2018, contudo o espaço para procrastinar as reformas estruturais está se mais curto.

 

Os indicadores recentes de atividade econômica sustentam nossas expectativas de crescimento mais robusto neste ano. Na seara inflacionário, se observara manutenção da tendência de descompressão nos preços, muito em função do ciclo benigno de chuvas desde dezembro do ano passado, que deve levar a condições de oferta que manterão a inflação de alimentos em baixo patamar por mais tempo que antes antecipado. Por outro lado, em que pesem as controvérsias em torno da real magnitude do hiato do PIB, os componentes da inflação mais sensíveis ao ciclo econômico, como os serviços subjacentes, continuam indicando que a economia ainda opera com substancial capacidade ociosa, validando a extensão do atual ciclo de flexibilização monetária, com mais um corte de 25 pontos-base da taxa de juros. Isso reforça nossa expectativa de uma alta significativa da demanda doméstica, em parte puxada pela expansão do crédito.

 

Do ponto de vista das contas externas, o Brasil parece aparelhado para lidar, no curto prazo, com as turbulências que podem advir de uma reversão mais drástica das condições monetárias e financeiras internacionais. Não obstante, esse quadro vai limitando gradualmente o espaço que ainda existe para protelar a solução dos problemas fiscais estruturais do nosso país. Irá esse risco viabilizar reformas mais significativas? Não acreditamos nisso: protelar tem sido exatamente a conduta escolhida pelo corpo político brasileiro desde pelo menos o segundo semestre de 2017, e cada vez mais os políticos vão se voltar para a disputa eleitoral que se avizinha este ano, não para as reformas.

 

O mercado financeiro, por sua vez, continua anestesiado pelo abundante fluxo de notícias positivas no front doméstico e pela elevada liquidez internacional, na expectativa de que o próximo ocupante da Presidência da República terá de inevitavelmente lidar com a agenda de reformas de que o país necessita.

 

No ambiente externo, no entanto, algumas mudanças no cenário até então atipicamente benigno começam a emergir. O cenário de aceleração do crescimento nas principais economias do mundo e de moderada re-inflação global manteve-se em curso nos últimos meses. Isso reforça a expectativa de que a normalização das condições monetárias tanto na Europa como, principalmente, nos Estados Unidos manterá o curso previsto e pode até ser um pouco acelerada. Inclusive por conta do impulso fiscal derivado do pacote tributário do governo Trump, lançado em um momento em que o mercado de trabalho se encontra próximo ao pleno emprego e a capacidade ociosa da economia praticamente suprimida. O pacote deve acelerar a inflação em algum momento, ainda que não seja claro quanto, quando e que tipo de reação despertará no Fed. Tudo isso se traduziria em elevações mais consistentes das taxas de juros internacionais, o que, por sua vez, teria reflexos na condução da política monetária e na curva de juros aqui no Brasil.

 

Ainda assim, não há muitas dúvidas de que o cenário de liquidez global abundante deve continuar no curto e médio prazos, mas agora sujeito a maior volatilidade nos mercados internacionais, em função da maior incerteza sobre a evolução da política monetária americana. Subsidiariamente, e isso deve nos ajudar, os sinais são de que o dólar deve permanecer próximo ou até mais fraco do que o patamar atual.

 

Na Europa, por sua vez, os dados econômicos também continuaram evoluindo favoravelmente, com sinais de maior crescimento das economias e tendência moderada de re-inflação. Em termos de política monetária, o plano de voo original segue firme – o tapering será mantido até setembro, e dali em diante a política monetária evoluirá de acordo com os indicadores de crescimento e inflação. Continua valendo, porém, o cenário central de ajustes nas condições monetárias tão pequenos quanto possíveis, de forma a não abortar o processo de recuperação do crescimento.

 

PIB

Após a divulgação dos indicadores de atividade econômica relativos ao quarto trimestre, mantivemos a projeção de alta de 0,2% ToT (2,4% AOA) para o PIB neste período, consistente com um crescimento de 1,1% em 2017. A projeção para 2018, no entanto, subiu 0,1 ponto percentual (pp), para 2,9%, em função, por um lado, de melhores perspectivas para a produção agropecuária este ano – consequência do ciclo benigno de chuvas em dezembro de 2017 e janeiro de 2018, que beneficiou alguns dos cultivos de maior peso – bem como, por outro, de resultados mais positivos observados na atividade industrial.

 

Mercado de Trabalho

Os últimos dados publicados, referentes a dezembro de 2017, dão sinais positivos de recuperação. A taxa de desemprego medida pela PNADC foi de 11,8% em dezembro, seguindo a tendência de gradual declínio observada ao longo de 2017, embora esse resultado ainda permaneça muito distante do nível pré-crise. Entre os fatores que contribuíram para a queda do desemprego em dezembro está a surpreendente reação da população ocupada (PO) com carteira assinada. Com efeito, o CAGED registrou destruição líquida de “apenas” 330 mil vagas em dezembro de 2017, melhor resultado para este mês desde 2007. Ajustado sazonalmente, esse número representa uma criação expressiva de 112 mil vagas formais no último mês do ano passado. Antevemos um crescimento absoluto mais intenso do emprego formal em 2018, mas não acreditamos que ele irá superar o aumento também intenso do emprego informal. Assim, projetamos um ganho de participação das ocupações informais na PO total.

 

Inflação

As primeiras divulgações do IPCA de 2018 trouxeram uma agradável surpresa: a menor inflação para janeiro desde a implantação do Plano Real. O aumento do volume de chuvas, ainda no final de 2017, recompôs o nível de importantes reservatórios nas principais regiões do país, levando a Aneel a autorizar a alteração da bandeira tarifária de vermelha para verde. Só esse movimento garantiu recuo de 4,7% nas contas de energia. Outra importante contribuição para a desaceleração da inflação em janeiro partiu dos serviços livres. Contrariando a lógica da sazonalidade de início de ano, os preços desses serviços permaneceram sem alteração significativa, variando apenas 0,06% no período.

 

Política Monetária

Haveria espaço para nova redução dos juros? A esse respeito, por meio da ata da mais recente reunião do Copom, os dirigentes do Banco Central sinalizaram que, na ausência de alteração relevante do cenário básico, seria adequado interromper o atual processo de flexibilização monetária. Acrescentaram, porém, que estavam abertos à possibilidade de um moderado movimento adicional de flexibilização, na hipótese de eventual mudança favorável do cenário e do balanço de riscos. O fato de dirigentes do BC acreditarem que a possibilidade de precisarem reverter determinada decisão mais adiante não constitui obstáculo para agirem hoje, de acordo com o cenário percebido, nos anima a realmente considerar a hipótese da queda adicional de 25 pontos em março.

 

Política Fiscal

Elasticidade receita-PIB: há certo otimismo quanto ao desempenho da arrecadação recente das receitas federais, devido a esta ter aumentado muito acima do PIB em 2017. A se confirmar o crescimento de 1,1% da economia em 2017, uma alta real de 3,4% das receitas administradas significaria que estas tiveram performance muito superior à da economia. Ocorre que em 2017 houve receitas atípicas sem contrapartida em 2016, que contribuíram bastante para esse resultado. Nossa analista conclui que, quando retirados esses efeitos, a arrecadação cresceu apenas 1,0% em termos reais na comparação com 2016. Ou seja, o crescimento da arrecadação esteve em linha com a expansão da economia.

 

Economia Internacional

As novas medidas fiscais aprovadas pelo governo americano no congresso devem produzir uma elevação do déficit público de aproximadamente 2 pontos percentuais do PIB, o que resultará em uma valorização da moeda americana. O argumento é que o aumento do déficit público geralmente produz um desequilíbrio entre oferta e demanda preferencialmente sobre os serviços não transacionáveis. A consequência é uma pressão sobre a inflação de serviços e uma realocação do sistema produtivo para elevar a produção de serviços e reduzir a produção de bens. Em resumo, esse processo requer uma valorização do câmbio. Pode haver desvalorização da moeda em seguida a uma piora fiscal? Sim, se houver a percepção de que o risco país aumentou. Nesse caso haverá saída de recursos e o câmbio imediatamente desvalorizar-se-á. Os juros terão que se elevar mais do que a elevação do risco país para que parte do déficit externo seja financiado por poupança externa. Não parece, no entanto, que haverá dificuldades para o financiamento, ao menos em um primeiro momento. Portanto, o fortalecimento da moeda americana somente não ocorrerá se o FED demorar muito para elevar os juros e houver um processo inflacionário maior. Porém, não parece ser esse o caso.

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